O sucesso do I Encontro Fluminense de Estudantes de Engenharia

Nos dias 11 e 12 de agosto 220 jovens universitários participaram do I Encontro Fluminense de Estudantes de Engenharia. Concebido e organizado durante quatro meses por estudantes de instituições de ensino, públicas e privadas, com o apoio do Clube de Engenharia, através da Secretaria de Apoio ao Estudante de Engenharia (SAE), o resultado, entre palestras, oficinas e uma feira de estágios foi além das expectativas. Em debate, um Brasil em crise, universidades em processo de desmonte, ensino precário, o temor de um futuro profissional sem perspectivas de emprego e a firme disposição de mudar o rumo da história.

Experiência profissional

A abertura do evento, em 11 de agosto, sexta-feira, foi feita pelo presidente do Clube, Pedro Celestino, que mesmo abordando o quadro dramático da política do país e do desmonte da engenharia nacional, estimulou os estudantes a persistirem na área, tão fundamental para um Brasil que ainda está em construção. "Nosso país é um país que resiste. (...) O Brasil cresceu e precisa de mão de obra qualificada e das competências que os cursos que vocês estão cursando lhes dão", afirmou.

Em seguida, o ex-presidente do Clube e atual presidente da Academia Nacional de Engenharia (ANE), Francis Bogossian, falou sobre  "Emprego, Estágio e Desenvolvimento", quando relembrou sua vida profissional, especialização no exterior, atuação em empresa de geotecnia e fundação do seu próprio empreendimento na área. Francis destacou a importância do Clube de Engenharia em sua trajetória, ao participar das atividades da Divisão Técnica de Geotecnia (DTG) e estimulou os estudantes a frequentarem entidades de classe. No debate que se seguiu, os questionamentos abordaram desde intercâmbios, poucas perspectivas em relação ao mercado de trabalho, até como se destacar na profissão. Compuseram a mesa de debate, além de Francis Bogossian e Pedro Celestino, o conselheiro Stelberto Soares e Luiz Fernando Taranto, respectivamente coordenador e secretário executivo da SAE.   

O dia 12, sábado, começou com um animado café da manhã para, em seguida, com o tema “A Engenharia e um projeto de desenvolvimento para o país” o presidente Pedro Celestino resgatar resumidamente a história política do Brasil, em uma franca conversa na qual falou também da crise que se vive hoje e do imenso potencial brasileiro para superá-la. Em debate, Celestino elogiou a atitude dos estudantes presentes de, para além de seus obstáculos, irem atrás de formação técnica e política.

Os focos da formação

As preocupações dos estudantes a respeito de sua formação não se limitam à perspectiva de futuro. Há grande preocupação com o agora, com a qualidade do ensino que recebem, com as questões sociais que perpassam a vida universitária e profissional. Esses foram assuntos debatidos nas palestras "Gênero e etnia na Engenharia", "Formação do Engenheiro" e "O Exercício Profissional de Engenharia". Margarida Castello, professora do CEFET-RJ campus Maracanã, apresentou em "Formação do Engenheiro" os pressupostos legais do ensino de engenharia, levantando um debate sobre o que é e o que não é seguido e como os cursos poderiam ser melhores. "Precisamos investigar no processo quais são os pontos fracos da formação e trabalhar em cima deles. Isso foi extremamente positivo nessa palestra. Tentamos tirar propostas concretas, que possam ser levadas às instituições de ensino superior, que possam realmente ajudar a formar engenheiros melhores do que os que hoje estão sendo formados", defendeu. Para Clécio Santos, membro da Rede de Engenharia Popular Oswaldo Sevá, e Thaís da Silva, presidente do grupo Mulheres na Engenharia do IEEE Brasil (Women in Engineering - WIE), o ambiente universitário precisa se adaptar à diversidade de pessoas que nele ingressam ano a ano. "Os estudantes que estão entrando sentem a necessidade de usar a profissão para transformar a vida no entorno. Essa é uma demanda que nós escutamos para propor uma reforma do currículo", explicou Clécio Santos.

A conselheira Fátima Sobral Fernandes, que integra ainda o Conselho Editorial do Clube de Engenharia, na palestra "O Exercício Profissional de Engenharia" compartilhou sua história profissional com os presentes e os estimulou a abrirem seus horizontes: "Estamos em um momento de crise de desenvolvimento, mas é justamente aí que existe a oportunidade de inovar. Ser engenheiro é ser um agente transformador da natureza e da sociedade, que volta seu trabalho para a resolução dos problemas". 

Para contemplar os cursos de Química e Engenharia Química, o conselheiro José Eduardo Pessoa de Andrade apresentou a palestra "A Química das Engenharias" e abordou o surgimento da engenharia química como profissão específica, no final do século XIX, sua consolidação e transformações na formação do profissional.

Reprodução dos debates nacionais

Algumas questões que se destacam em debates no Clube de Engenharia também tiveram foco no Encontro de Estudantes, como o tema que coube ao diretor técnico Artur Obino desenvolver: "Matrizes Energéticas", tratando da composição da matriz energética no país. "É essencial discutir isso nas universidades, porque a energia elétrica é insumo para todos os demais setores da economia”, concluiu.

A palestra "Engenharia do Ambiente", apresentada pelo conselheiro Adacto Ottoni, sócio do Clube e professor associado da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), tratou da importância da sustentabilidade ambiental nas obras de engenharia e também de problemas urbanos, como resíduos sólidos e piscinões, que poderiam ser melhor resolvidos com uma gestão sustentável. Na parte da tarde, o mesmo tema foi apresentado pelos conselheiros Ibá dos Santos Silva, chefe da Divisão Técnica de Recursos Hídricos e Saneamento (DRHS), e José Stelberto Soares, coordenador da SAE.

Ibá falou dos compromissos brasileiros com o meio ambiente, firmados em documentos como o Protocolo de Kyoto e o Acordo de Paris e eventos como a Eco 92 e a Rio +20. Stelberto Soares contou da sua experiência com projetos de saneamento para o Rio de Janeiro, focando na importância da integração entre as áreas envolvidas no projeto. "Quando você planeja, você precisa ver todas as áreas. Isso é participação política, é compromisso com os que serão afetados", defendeu.

Outro conselheiro que contou sua experiência integrada com a história da cidade foi Affonso Canedo, subchefe da Divisão Técnica de Urbanismo e Planejamento Regional, na palestra "Urbanismo e Planejamento". Ele traçou um histórico da expansão urbana do Rio de Janeiro, desde a fundação, em meados do século XV, até tempos mais recentes, com as avenidas, túneis e outras adaptações das vias à cidade.

Oficinas: uso de ferramentas

Os estudantes puderam participar de diferentes oficinas técnicas voltadas para a apresentação de ferramentas utilizadas no dia a dia de engenheiros e engenheiras. Guilherme Vendramini apresentou a oficina sobre um aplicativo gratuito análogo à calculadora HP12-C, capaz de instrumentar ações, como fluxo de caixa. 

Victor Rodrigues, engenheiro eletrônico e mestrando pela UERJ, coordenou a oficina de MATLAB, software de cálculo avançado. “É uma ferramenta usada em diferentes áreas da Engenharia, como a Eletrônica, Civil e de Produção”. Ele aproveitou para elogiar o evento: "É um espaço necessário para troca de experiências”.

O programa Ftools, software de cálculo de estrutura bidimensional muito utilizado na Engenharia Civil, foi apresentado por José Ricardo Cardoso Domingues, estudante de Engenharia Civil e membro da SAE. Uma das oficinas mais procuradas foi sobre Excel, ministrada durante a manhã pelo conselheiro Miguel Bahury e Geraldo Sales Marinho, que apresentou a usabilidade da ferramenta para a vida acadêmica e profissional dos usuários. Durante a tarde, assumiram a oficina Alexandre Vaz e Orival Siqueira Junior. “As empresas valorizam essa ferramenta, então acreditamos que ela poderia estar integrada nos currículos de Engenharia. O estudante muitas vezes se forma tendo de procurar cursos para suprir essa demanda”, disse Orival.

Os espaços também permitiram a integração com profissionais de outras áreas. A arquiteta Tania Aguiar conversou com os estudantes sobre o AutoCad, software de desenho técnico utilizado em diferentes ramos da Engenharia. “Além do AutoCad, pude apresentar também o BIM, um software com metodologia mais moderna. Muitos estudantes não estão familiarizados com a ferramenta, então existe de fato uma demanda para aprendizado”, disse. Ana Cecília Soares, engenheira civil e sócia do Clube, ministrou a oficina de "Aplicativos para celular", apresentando ferramentas básicas, como calculadora e câmera com georreferenciamento, além de “regras de ouro” de um aplicativo de celular.

Em paralelo às oficinas e palestras, durante a tarde do dia 12 de agosto, a galeria do 22º andar do Clube abrigou uma feira de estágios. Representante do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE) fez o cadastro de cerca de 50 estudantes, que terão seus dados inseridos no sistema para serem encaminhados às vagas que surgirem. Cinco foram encaminhados para vagas de Engenharia de Petróleo, Engenharia Ambiental e Engenharia de Produção já existentes no sistema do CIEE.

Missão dada, missão cumprida

Ao final do evento, a equipe organizadora expressou satisfação em realizar todo o Encontro, considerado um projeto piloto de um formato de Encontro maior que se vem elaborando desde o início da SAE. "Para o primeiro, conseguimos alcançar um êxito bem satisfatório", afirmou Tatiana Ferreira, coordenadora geral do Encontro. Segundo ela, o legado que fica é da formação do núcleo de organizadores e a vontade de, através do Clube, oferecer mais atividades aos estudantes. Para Lucas Getirana, do DAOC UFF, o evento surpreendeu os participantes com a abordagem política dos temas: "As pessoas viram que aqui a gente quer debater a engenharia do país, para onde queremos ir, o que a gente pensa. Construir um pensamento de engenharia num entendimento de soberania nacional. É importante entender que não é só o mercado que tem que ser nossa preocupação".

No encerramento do evento, a equipe apresentou o documento “Carta Resolução do 1º Encontro Fluminense de Estudantes de Engenharia”, que publicamos a seguir, expressando o que a equipe acreditou que fica como aprendizado do Encontro para a formação universitária e para a atuação dos engenheiros de hoje e do futuro próximo, como cidadãos e sujeitos políticos.

Organizaram o evento lideranças do Centro Acadêmico de Engenharia (CAEng UFRJ) da Universidade Federal do Rio de Janeiro(UFRJ); Diretório Acadêmico Octávio Catanhede(DAOC UFF) da Universidade Federal Fluminense; Centro Acadêmico de Engenharia (CAEng UERJ); Diretório Acadêmico da Escola de Química (DAEQ UFRJ);  Grupo Acadêmico de Engenharia / GAE - Estácio Norte Shopping; SAE - CEFET Maracanã e SAE – SUESC; da Sociedade Unificada de Ensino Superior e Cultura (Suesc), além do Clube de Engenharia, através da SAE.

 

CARTA RESOLUÇÃO

1º Encontro Fluminense de Estudantes de Engenharia

Ao dia 12 de agosto de 2017 encerrou-se o 1º Encontro Fluminense de Estudantes de Engenharia organizado pelos futuros engenheiros, com apoio do Clube de Engenharia através da SAE. O encontro abordou os temas: Formação do Engenheiro, Engenharia do Ambiente, A Química nas Engenharias, Equidade de Gênero e Etnia na Engenharia, Matrizes Energéticas, Urbanismo e Planejamento, O Exercício Profissional de Engenharia e A Formação do Engenheiro. Contou, ainda, com cursos introdutórios: aplicativos para celular para Engenharia, Excel, MatLab, AutoCad, Ftools e HP12C. A temática central do encontro expõe-se na palestra inaugural, ministrada pelo Ilmo. Presidente do Clube de Engenharia, Pedro Celestino: A Engenharia e um projeto de desenvolvimento para o País.

O Brasil vive um momento difícil em sua realidade política e econômica, e isso é enxergado por todos e todas. O que não é tão visível ao olhar despreocupado é o que está por trás dessas realidades. Interesses que embarreiram deliberadamente o desenvolvimento de nossa soberania nacional, através do desmonte de empresas nacionais, do fantasma da privatização de setores estratégicos para nossa soberania, da entrega de nossas riquezas e do controle de componentes fundamentais para nossa retomada ao crescimento – como energia –, ao domínio do capital internacional, entre outros, e tudo isso tocado junto aos poderes constitucionais do país.

Nesse sentido, faz-se necessário repensar o que é ser engenheiro(a) e como nossa atuação ética, profissional, cívica e cidadã caminham com muita proximidade à retomada do crescimento do país e da reconquista de nossa soberania. Historicamente, os movimentos de crescimento econômico e soberano dos países deram-se acompanhados do planejamento estratégico dos diferentes setores de engenharia, e no Brasil não há de ser diferente. Exemplos que ilustram essa realidade não faltam, desde o expansionismo das consideradas “grandes potências” nos pós-guerras, como o recente crescimento exponencial de países ditos emergentes até décadas passadas, como é o caso da China, onde os cargos de seus poderes são muitas vezes ocupados por engenheiros.

Ser engenheiro(a) é o ato de, por essência, ser capaz de engenheirar, transformar a realidade de situações indesejadas em soluções esperadas, não se abstendo da necessidade de aprender conceitos, técnicas e/ou fundamentos que, à primeira vista, não estejam necessariamente relacionados à atividade profissional de seu estudo na graduação, mestrado ou doutorado. É entender que a multidisciplinaridade, a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade não podem ser conceitos, mas sim parte fundamental da execução profissional. É saber que nossos currículos precisam de atualizações, que nossas instituições de ensino precisam oferecer melhores condições de aprendizado prático, que o fomento à pesquisa e extensão devem ser garantidos em todos os cursos de Engenharia e que o estágio é parte fundamental do aprendizado profissional, não necessariamente devendo ser junto ao canteiro de obras, uma vez que cabe ao(à) engenheiro(a) a benesse da amplitude de funções por sua formação de ensino analítico e estratégico, mas entender que, apesar das dificuldades, o(a) engenheiro(a) possui total capacidade de ditar sua formação, contra todos os obstáculos impostos pela dura realidade do ensino no país.

Pela retomada do crescimento econômico, pelas necessárias reformas acadêmicas de nossas grades curriculares, pelo reforço da ética profissional, pelo fim do sexismo e dos preconceitos em nossa classe e no mundo, pela ampliação do perfil profissional do(a) engenheiro(a) e sua inserção nos espaços de decisão e planejamento estratégico, pela garantia de um desenvolvimento sustentável, pela retomada do desenvolvimento de tecnologias de soberania nacional, pela resolução de problemas sociais, pela defesa de nossas riquezas, pelo controle soberano de infraestrutura básica e pelo fortalecimento de nossas indústrias nacionais, nós, aqui presentes, apresentamos esta Carta Resolução ao fim do 1º Encontro Fluminense de Estudantes de Engenharia.

Rio, Clube de Engenharia,
12 de agosto de 2017

 

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