Por Eugênio Miguel Mancini Scheleder*
Revista Brasil e Energia Petróleo e Gás / julho de 2017

Em 2013, os preços de equilíbrio do óleo de xisto nas principais províncias norte-americanas variavam de US$66/barril, na formação Bakken, a US$98/barril, na Permian Midland. Três anos depois, esses preços caíram para US$29 e US$39/barril, respectivamente. Os elevados preços praticados no mercado mundial estimularam o desenvolvimento de novas tecnologias de perfuração e fratura, tornando possível o início da produção de um campo em apenas seis meses após a sua avaliação, com investimentos substancialmente menores do que os necessários para explorar outros tipos de reservatórios. Em 6 anos, desde 2008, o óleo de xisto passou de 10% da produção total de petróleo dos EUA para cerca de 50%, com elevação de 4 milhões de barris/dia.

A extraordinária resiliência à variação de preços e a capacidade de escoar grandes volumes em prazo tão curto transformou a produção de óleo de xisto em uma enorme ameaça ao poder regulador da OPEP. Hoje, com um mínimo de alavancagem, os produtores de petróleo de xisto podem, em questão de meses, responder aos cortes de produção dos países exportadores. De fato, desde que a OPEP decidiu cortar 1,2 milhão de bpd, sete meses atrás, a produção de óleo de xisto dos EUA aumentou cerca de 600 mil bpd, ocupando metade do espaço aberto no mercado. De acordo com a U.S. EIA, a produção de petróleo norte-americana superará os 10 MM de bpd no final do próximo ano e.somente o óleo de xisto elevará essa produção em 1,3 MM de bpd, absorvendo quase todo o crescimento esperado da demanda mundial em 2018.

Vários outros países, como China, Argentina e Reino Unido, já trabalham no desenvolvimento de suas abundantes reservas de óleo de xisto, a despeito do cenário atual de preços deprimidos. A produção desses países, a iniciar no futuro próximo, elevará o poder de influência dos produtores não convencionais sobre o mercado global. Os países exportadores já perceberam que a produção a partir de xisto será cada vez mais competitiva e avançará sobre as suas cotas de mercado. Muitos analistas acreditam que essa disputa manterá os preços mais baixos por um período de tempo bastante longo, afetando, negativamente, os produtores com maiores custos de exploração e produção, como aqueles que exploram jazidas  em águas profundas e ultraprofundas.

Conscientes das mudanças que virão, as grandes companhias petroleiras já vêm se posicionando para enfrentar as dificuldades implícitas neste novo cenário. Em um mercado cada vez mais restrito, elas estão investindo na integração de atividades, na produção com maior valor agregado, em energias renováveis e na diversificação dos negócios. Produtos petroquímicos e fertilizantes são, também, opções de agregação de valor ao petróleo e ao gás natural, para os produtores menos competitivos.

A atual direção da Petrobras, no entanto, insiste em ignorar o futuro que vem por aí. Os gestores da empresa estão obcecados por uma visão financeira de curto prazo e empenhados na materialização de um plano de negócios obtuso e desprovido de visão estratégica. Promovem a venda de ativos estruturantes das principais fontes de receita da empresa como se fosse a única solução para o equacionamento da dívida. Não se tem notícia da venda de sistemas de transporte e do controle acionário de empresas distribuidoras de grandes grupos como a Shell, Total, Chevron, BP e ExxonMobil, todas elas afetadas pela crise de preços baixos. As distribuidoras são fundamentais para as petroleiras mundiais, pois é a partir delas que as companhias levam a sua marca aos consumidores.

O PNG 2017-2021 prevê que a Petrobras terá uma fonte de recursos de US$179 bi até 2021, incluída uma parcela de: US$19 bi correspondente a parcerias e desinvestimentos. Esses recursos serão destinados à cobertura de investimentos (US$74 bi) e ao pagamento de amortizações (US$73 bi) e despesas financeiras (US32bi) da dívida contraída pela companhia. Parcerias e desinvestimentos representam a venda de partes da empresa, no momento em que os baixos preços do petróleo desvalorizam os ativos do setor no mundo inteiro. A BR Distribuidora, os sistemas de transporte e as unidades de refino são ativos rentáveis e estratégicos para a Petrobras e a sua alienação, total ou parcial, desestrutura a maior fonte de receitas da empresa.

A verdade é que não há necessidade de vender esses e outros ativos. Os US$19 bi que seriam gerados pelas vendas podem ser obtidos pela redução do total de amortizações e despesas financeiras do período, de US$ 105 bilhões para US$ 86 bi, utilizando os mecanismos de negociação da dívida existentes no mercado. Em captações recentes, de grande aceitação pelos investidores, o custo de rolagem da dívida tem se situado na faixa de 5 a 7% ao ano, muito menor, portanto, do que a rentabilidade dos ativos das áreas de abastecimento e de distribuição. Outras possibilidades, como o lançamento de debêntures e a abertura de capital da BR, também contribuiriam para equacionar o endividamento, preservando os ativos estratégicos da Petrobras.

No futuro que virá, as empresas não integradas e que se dediquem unicamente à exploração de O&G, em especial, na atividade “offshore”, correm o risco de, simplesmente, desaparecer. O destino da Petrobras sempre foi, desde a criação, o de uma grande empresa de petróleo integrada e verticalizada do poço ao posto, presente em todo o território nacional, proprietária e operadora de sistemas de produção, transporte, refinarias, unidades petroquímicas, fábricas de fertilizantes, plantas de biocombustíveis e termelétricas. A força desse destino é que impedirá o desastre anunciado no PNG 2017-2021.

Publicado em junho de 2017
Fonte: Rystad Energy NASWellCube
           US Energy Informationl Administration 

*Eugênio Miguel Mancini Scheleder é engenheiro aposentado da Petrobras. Também
ocupou cargos de direção nos ministérios de Minas e Energia e do Planejamento, de
1991 a 2005. Atualmente, exerce a função de Mediador Extrajudicial, capacitado pela
Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem – CCMA/RJ. 

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